Muita gente já louvou a excelência da Bahia, mas nunca de forma tão melancólica e bruta como Rodrigo Campos. Não que o recém-lançado álbum ‘Bahia Fantástica’ seja uma obra triste, longe disso, mas simplesmente não exalta apenas a alegria nem a simpatia do povo soteropolitano. Sem falar na força das melodias, do vigor dos arranjos e do arrojo dos sopros.
O disco começa com a frase “daqui pra lá não vá dizer, que a Bahia não lhe achou”, em ‘Cinco doces’, que contrapõe a delicadeza do dedilhado do violão do próprio Campos com a fortaleza do saxofone de Thiago França (MarginalS, Sambanzo e Metá Metá), com alguma intromissão de Maurício Fleury (Bixiga 70).
Em ‘Princesa do mar’ você sente o privilégio de ouvir a guitarra suingada de Kiko Dinucci (Bando AfroMacarrônico, Duo Moviola, Metá Metá, Sambanzo e Passo Torto) junto com o sempre firme saxofone, que também pontua a bela ‘Sete vela’, que começa líricamente com a viola de Renato Rossi e o violino de Luiz Gustavo Nascimento. É sensacional o dueto entre o saxofone e o violino e a viola, mas também há o auxílio luxuoso da banda formada pela bateria de M. Takara (Hurtmold), Fleury, Dinucci, Campos e Marcelo Cabral (MarginalS, Sambanzo e Passo Torto).
Esse disco tem diversas participações como Luisa Maita em ‘Morte na Bahia’, um afoxé de tradição tambor e flauta. Juçara Marçal empresta a voz para ‘Jardim Japão’, que conta com a guitarra psicodélica de Guilherme Held. Já o Criolo canta a bela crônica de ‘Ribeirão’, com programações de Gui Amabis, que também programou em ‘Capitão’, que tem um belo arranjo de cordas de Cabral, que toca baixo em todas as faixas. Além de Rômulo Fróes (Passo Torto), que atuou como diretor artístico e Gustavo Lenza, que gravou e mixou.
É verdade que as crônicas do disco mais remetem à periferia conhecida por Campos que à Bahia. Segundo ele, “a Bahia se transformou numa metáfora sobre a incompreensão, sobre o medo e o deslumbramento de estar diante de algo maior e intangível”, em entrevista para o Itaú Cultural. O tema principal do ‘Bahia Fantástica’ é o medo da morte, do fim, do encerramento e de todas outras possíveis metáforas nesse caso.
O álbum está repleto de personagens, que tanto poderiam transitar com a malemolência da “maloqueiragem da 18”, como ‘Elias’, ou com a desesperança de ‘Aninha’, que todo fim de tarde morre em 10 minutos – ambas faixas têm em comum o fino entrosamento de banda e arranjos. O ‘Beco’ também apresenta Nani e Beto, que mantêm o local como ponto de encontros e desencontros, como bem refletem todas crônicas urbanas periféricas de Campos, desde seu primeiro álbum, ‘São Mateus Não é um Lugar Assim tão Longe’, de 2009.
A leve canção ‘General Geral’ aparece com um teclado marcante e um saxofone repentino no final. A letra é um belo hai-kai sobre um tal de “Geraldo, o General”. Para fechar a tampa, Campos ainda canta que “chegou na Bahia de manhã” em ‘Sou de Salvador’, reafirmando a ideia do álbum cantar uma Bahia que “no meu imaginário, é algo mítico, complexo, sem significado objetivo, por todos os seus paradoxos como nascedouro do Brasil, da cultura brasileira, do sincretismo religioso, da miscigenação. É o início. E é, justamente, o início como metáfora do fim, da morte, pois a perplexidade existe em relação a esses dois polos”.
Para quem conheceu a Bahia há e em pouco tempo, Campos pode dizer com bastante propriedade que “tem Bahia pra você”.
2012 Bahia Fantástica
1. Cinco doces
2. Princesa do mar
3. Ribeirão
4. Beco
5. Morte na Bahia
6. Sete vela
7. Aninha
8. Jardim Japão
9. General Geral
10. Elias
11. Capitão
12. Sou de Salvador
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